quinta-feira, 31 de março de 2011

Texto que foi lido no CONSU

Campinas, 29 de Março de 2011.

Aos membros do CONSU,

A ocupação da administração da moradia que teve início no dia 03 de marco de 2011 tem como uma de suas bases o acordo feito entre a Reitoria da UNICAMP, representada pelo professor Paulo Renato de Souza, e os estudantes do movimento TABA. Neste acordo, caso a UNICAMP não cumprisse com a parte dela em construir as 1500 vagas – 10% dos estudantes da universidade naquele ano ( 1987 ) – os estudantes poderiam ocupar um espaço da universidade equivalente ao do Ciclo Basico ( local ocupado pela TABA ). Porém, desde a sua construção temos ainda 900 vagas, fato que evidencia que a Moradia já naquela época não abrangia os 10% dos estudantes com baixa renda na universidade. Assim, por lógica, a presença de em média 600  estudantes (chamados de “hóspedes” pela UNICAMP e de moradores não-oficiais, por nós ) já era esperada.
Hoje, 23 anos depois, a universidade tem por volta de 33.000 estudantes e com apenas 900 vagas na Moradia fica óbvia a superlotação das casas e a gritante a necessidade da ampliação de vagas. Esta é a nossa principal reivindicação, visto que “a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”- LDB - não é um privilégio ou caridade, mas um direito assegurado pela própria Constituição (DECRETO Nº 7.234, DE 19 DE JULHO DE 2010), e pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases, título I, artigo 3º).
                Uma de nossas reivindicações diz respeito à forma como a Moradia vem sendo administrada. Visto que os últimos coordenadores, os quais têm apenas poder executivo de acordo com a deliberação CONSU-A-24/01, de 27/11/2001 Cap. 3 Art 7 - “A direção do PME será exercida deliberativamente por uma Coordenação Deliberativa do Programa de Moradia Estudantil e administrativamente por um coordenador executivo, assessorado por um Conselho Consultivo” - a desrespeitaram em todas as vezes que agiram arbitrariamente sobre questões concernentes a toda a comunidade, e que, portanto, deveriam passar pelo Conselho Deliberativo – instancia máxima do PME.

 Assim, desde o início da gestão de Luiz Antônio Viotto, algumas medidas foram tomadas sem tal consulta, outras não foram executadas corretamente, além de casos em que observamos uma completa indiferença para com os moradores:

1) Expulsão de moradores e dissolução de três casas em 2010 sem a consulta do Conselho Deliberativo, tirando a legitimidade dessa instância ao levar esses casos para uma instância maior – Procuradoria Geral, no caso.

2) Tentativa injustificada de expulsar famílias da moradia em 2010 sem a consulta do Conselho Deliberativo (o caso das famílias com crianças maiores de 7 anos)

3) Tentativa injustificada de expulsar estrangeiros sem a consulta do Conselho Deliberativo (indicando tendências xenófobas da administração)

Obs. Nos casos 2) e 3) a agilidade e a união de alguns estudantes pode impedir que as injustiças fossem cometidas pela administração da moradia.

4) Impedimento injustificado do uso de espaços de vivência sem a consulta do Conselho Deliberativo (ateliê, CV3 e CV4) impedindo os projetos já assinados de prosseguirem com seu cronograma por não conseguirem acessar estes espaços.

“O programa de moradia estudantil tem como um de seus objetivos possibilitar a integração entre os estudantes.” (Deliberação CONSU-A-24/01, de 27/11/2001 Art. 3 item iii.)

5) Utilização do CV4 como almoxarifado (um espaço que não foi construído e não possui estrutura para tal, comprometendo a regularidade da reforma da moradia)

6) A não demonstração dos gastos referentes à moradia e à reforma, uma vez que os moradores exigiram inúmeras vezes.

7) Utilização indevida dos corredores entre os blocos como depósitos de materiais da reforma e de móveis antigos que foram recolhido das casas. Tendo como resultado a proliferação de animais e insetos nocivos (baratas, ratos e pombos)

8) Algumas casas foram reformadas recentemente e no entanto, a cada chuva, inúmeras goteiras, rachaduras e outros problemas se mantém nos cômodos.
Por isso reivindicamos o afastamento do atual coordenador, juntamente com uma reestruturação no Regimento do PME, que garanta a participação direta dos moradores, tanto na escolha da administração quanto no seu funcionamento.
Outra das reivindicações é sobre a intervenção da polícia nas questões da UNICAMP, mais especificamente da moradia, em que no único espaço de dialógo que o reitor se dipôs a ter com os estudantes foi no batalhão da polícia, com ela mediando o assunto, e ainda nessa suposta negociação não seriam pautadas nossas reivindicações, mas sim e exclusivamente a reintegração de posse. O ocorrido – a entrada da polícia na Moradia para a desocupação - aconteceu mesmo depois das vezes em que tentamos negociar com o Reitor e não conseguimos devido ao seu argumento de que enquanto estivéssemos ocupados, não haveria negociação. Porém, tal argumento não nos contemplou visto que além de termos a validação da garantia da ocupação prevista no documento de 1987 - já citado acima –, acreditarmos na urgência das nossas pautas, a ocupação possuiu legitimidade jurídica e política, concedida pelo juiz Mauro Iuji Fukumoto, através da liminar 287/11, o que nos levou a mais tentativas de negociação.
Um dos trechos da liminar que legitimou a ocupação foi: “(...) a ocupação de prédios públicos é, tradicionalmente, uma forma de protesto político, especialmente para o movimento estudantil, caracterizando-se, pois, como decorrência do direito à livre manifestação do pensamento (artigo 5º, IV, da Constituição Federal) e do direito à reunião e associação (incisos XVI e XVII do artigo 5.* Inclusive, nessa liminar diz que, “a ocupação é promovida por estudantes, representados pelo DCE”* e não por pessoas “estranhas à comunidade universitária”, como alega a UNICAMP em seu documento emitido pelo boletim “Note Bem.”
Com isso, notamos elementos antidemocráticos, por parte da UNICAMP uma vez que ela não aceita conversar com estudantes – pelo menos sem a presença da polícia – e nem sobre as suas pautas. Ao mesmo tempo em que degenera a nossa imagem em seus boletins e reprime nosso direito de livre expressão, quando caracteriza a ocupação sob o signo do crime – fato contestado pelo juiz Mauro Iuji Fukumoto. Além disso, não permite representantes dos estudantes na comissão de seleção dos moradores, não permite a participação dos estudantes na escolha dos administradores da moradia, quanto menos nos critérios para a eleição do reitor, e desconsidera o peso que o voto dos alunos tem no CONSU. Portanto, entendemos que a UNICAMP vai contra a ‘plena democracia’ – a qual em seu boletim diz ter - , agindo de forma truculenta em relação ao próprio Estado de Direito**.
Por fim, agora que não mais estamos ocupados  - condição esta colocada pelo Reitor para a abertura do diálogo  – exigimos uma negociação referente às nossas reivindicações.

Movimento Novos Tabanos.
** Estado de Direito é aquele em que o poder exercido é limitado pela Ordem Jurídica vigente, que irá dispor, especificamente, desde a forma de atuação do Estado, suas funções e limitações, até às garantias e direitos dos cidadãos. Dessa forma, tanto Estado, quanto seus indivíduos são submetidos ao Direito.

Liminar:
114.01.2011.011948-2/000000-000 - nº ordem 287/2011 - Possessórias em geral - UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS - UNICAMP X DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES / DCE - UNICAMP - Fls. 40 - A decisão de fls. 26/27, respeitado o entendimento da magistrada que o prolatou, comporta reconsideração, à luz da petição de fls. 32/39. É que a ação foi ajuizada contra “um grupo de invasores de qualificação desconhecida” (fls. 02), noticiando-se na inicial que “cerca de 50 (cinqüenta) pessoas, dentre elas alguns alunos, invadiram a Administração do Programa de Moradia Estudantil da UNICAMP”
(fls. 02). Apresenta-se agora o Diretório Central dos Estudantes da UNICAMP como responsável pela ocupação, o que indica que não se trata de ato promovido por pessoas estranhas à comunidade universitária. A inicial descreve a conduta como “a continuidade dos protestos que ocorreram no dia 02/03/2011, por ocasião do cumprimento de liminar de Reintegração de Posse”
(fls. 03). E, de fato, ocupação de prédios públicos é, tradicionalmente, uma forma de protesto político, especialmente para o movimento estudantil, caracterizando-se, pois, como decorrência do direito à livre manifestação do pensamento (artigo 5º, IV, da Constituição Federal) e do direito à reunião e associação (incisos XVI e XVII do artigo 5º). Não se trata propriamente da figura do esbulho do Código Civil, pois não visa à futura aquisição da propriedade, ou à obtenção de qualquer outro proveito econômico. A situação em tela não se amolda à proteção possessória prevista nos artigos 920 e seguintes do Código de Processo Civil, especialmente aos critérios dos artigos 927 e 928 para a concessão da liminar. Inegável, por outro lado, que toda ocupação causa algum transtorno ao serviço público - se assim não fosse, pouca utilidade teria como forma de pressão.
Há que se ponderar, dentro de um critério de razoabilidade, a importância do serviço público descontinuado pela ocupação, de um lado, e o resguardo dos direitos constitucionais supra mencionados, de outro. No caso em tela, reitere-se que a ocupação é promovida por estudantes, representados pelo DCE. Embora os bens da autarquia não pertençam à comunidade universitária, mas à população em geral, é inegável que visam primordialmente ao atendimento de demandas dessa comunidade. Tratando-se de prédio destinado à Administração da Moradia Estudantil, em princípio, os únicos prejudicados pela paralisação dos serviços seriam os moradores, ou seja, os próprios estudantes que, por meio de sua entidade representativa, mantêm a ocupação.
Não se vislumbra prejuízo a qualquer atividade acadêmica ou, mais ainda, a qualquer serviço prestado à população em geral.
Portanto, no caso específico, não vislumbro periculum in mora que justifique a concessão da liminar. Ressalto, pelos motivos acima expostos, que solução diversa poderá ocorrer se houver a ocupação de outros prédios públicos, como aventado no penúltimo parágrafo de fls. 05. Isto posto, reconsidero a decisão de fls. 26/27 para indeferir a liminar. Recolha-se o mandado já expedido, independentemente de cumprimento. Considerando que o Diretório Central dos Estudantes assumiu, ao que parece, a responsabilidade pelo ato, deverá figurar no pólo passivo. Tendo-se dado por citado, concedo o prazo de quinze dias para contestação. Int. Cps, d.s. Juiz de Direito - ADV ROSA MARIA DA SILVA BITTAR MAGNANI OAB/SP 72720 - ADV VANDRÉ PALADINI FERREIRA OAB/SP 218503

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